|
||||||||||||
|
||||||||||||
|
Interfaces
da Cultura Portuguesa e Europeia *
José Eduardo Franco Passam, em 2005, vinte anos sobre o desaparecimento do Padre Manuel Antunes (n. 3/11/1918 – m. 18/01/1985). Foi um mestre excepcional que marcou para a vida toda milhares de estudantes que, ao longo de mais de um quarto de século, passaram pela Faculdade de Letras de Lisboa desde 1957. A sua memória continua viva e a iluminar o caminho de muitos. O professor, cuja competência, sentido humanista e abertura à actualidade atraíram o interesse e admiração dos alunos, também estendeu a mais vastos públicos o seu magistério, graças aos inúmeros artigos que foi publicando, mensalmente, na revista Brotéria por ele dirigida, anos a fio. Embora as palavras voem, delas resta, hoje ainda, a grata recordação de quantos tiveram o privilégio de as escutar na qualidade de alunos. De modo mais fiel e duradoiro, muitas dessas palavras conservam-se escritas nos vários milhares de páginas assinadas na Brotéria por Manuel Antunes e pelos seus 124 pseudónimos. Se este património oral e escrito já impressiona e se impõe pela dimensão invulgar, torna-se muito mais valioso e fascinante quando lhe avaliamos a variedade de assuntos e, sobretudo, a qualidade de doutrina e de estilo. Nos tempos difíceis que a sociedade atravessa, com a ágora nacional atordoada pela vozearia ululante, parece de elementar bom senso o regresso ao silêncio criador em que se possam escutar palavras de sabedoria que nos ajudem a redescobrir os valores fundamentais e a “repensar Portugal”. Neste contexto, a actualidade de Manuel Antunes, em vez de nos fixar no passado irremediavelmente desaparecido, deve reconfortar a nossa vontade de futuro, apetrechando-a com o sentido das coisas essenciais tão facilmente corroído pelo acessório e pela sedução do superficial. De entre os créditos associados à memória do mestre notável, contam-se o perfil de humanista, a escuta atenta dos sinais dos tempos, a disponibilidade para ouvir o outro e compreender as diferenças, a procura do essencial na floresta do efémero, o espírito de tolerância, a opção pelo que aproxima e une em vez do que pode afastar e dividir, o gosto do universal cultivado no conhecimento do singular, a arte da síntese que não despreza a paciência da análise nem o enraizamento concreto, a consciência de cidadania vivida com responsabilidade e vigilância. Estes são alguns dos muitos traços que fazem do percurso intelectual e cívico de Manuel Antunes uma referência de cultura que a sociedade portuguesa não pode perder de vista se quiser manter a sua identidade e vencer a batalha do futuro. Há uma lição de vida que é capaz de equilibrar e potenciar até os êxitos da especialização sectorial. Consiste em manter sempre vivo o sentido do universal, quando parece que todas as energias só podem estar concentradas em tarefas singulares. Diremos que esta presença da totalidade no processo de desenvolvimento de cada uma das suas partes realiza uma concepção sistémica da existência do universo e de cada pessoa humana. Esta concepção anima a visão do mundo que se revela nos interesses de pensamento e de acção presentes na extensa e diversificada obra de Manuel Antunes. Embora seja possível distribuir os seus escritos pelas grandes áreas disciplinares da cultura clássica, filosofia e história da cultura, estética e crítica literária, pedagogia e educação, religião, teologia e espiritualidade, política nacional e internacional, não só verificamos com incontido fascínio que tudo está em tudo, mas que tudo deve servir o claro desígnio de tornar o homem mais humano. Por tudo isto, homenagear o Padre Manuel Antunes passa a ser muito mais do que puro gesto comemorativo e de merecido reconhecimento oferecido a quem cumpriu exemplarmente as missões que lhe foram confiados. Será, sobretudo, uma acção de resistência aos modelos de mediocridade e de pensamento débil, restabelecendo os padrões axiológicos e de nobreza de alma que tonificam as páginas sábias do grande mestre. É em conformidade com este espírito que adquirem todo o sentido os dois grandes projectos seguintes: realizar um Congresso Internacional nos dias 15, 16 e 17 de Dezembro de 2005 para analisar, aprofundar, actualizar e difundir os tópicos e propostas maiores do pensamento do nosso mestre de Humanidades; e editar as suas Obras Completas, durante os próximos três anos. Estas duas iniciativas principais integram-se num programa mais vasto de homenagem nacional a esta figura cimeira da cultura portuguesa do século XX. Este programa de homenagem está a ser promovido pela Equipa Padre Manuel Antunes, sedeada na Casa da Comarca da Sertã (terra de nascimento de Manuel Antunes), à qual se associaram como entidades promotoras a Academia das Ciências de Lisboa, o Centro Nacional de Cultura, a Reitoria da Universidade de Lisboa e a Faculdade de Letras da mesma universidade, a Câmara Municipal da Sertã, a Revista Brotéria e com ela a Companhia de Jesus e a Faculdade de Teologia da Universidade Católica Portuguesa. |
||